EÇADE QUEIROZ

O MANDARIM






LIVRARIA INTERNACIONAL
DE
ERNESTO CHARDRON, EDITOR.
Porto e Braga

1880




O MANDARIM

PROLOGO



1.º Amigo(bebendo Cognac e soda, debaixo d'arvores, n'umterraço, á beira d'agua)


Camarada, por estes calores do estio que embotam a ponta da sagacidade,repousemos do aspero estudo da Realidade humana... Partamos para oscampos do Sonho, vaguear por essas azuladas collinas romanticas [2]onde seergue a torre abandonada do Sobrenatural, e musgos frescos recobrem asruinas do Idealismo... Façamos phantasia!...


2.º Amigo


Mas sobriamente, camarada, parcamente!... E como nas sabias e amaveisAllegorias da Renascença, misturando-lhe sempre umaMoralidade discreta...


(ComediaInedita).

I


Eu chamo-meTheodoro―e fui amanuense do Ministerio do Reino.

N'esse tempo vivia eu á travessa daConceição n.º 106, na casa d'hospedes daD. Augusta, a esplendida D. Augusta, viuva do major Marques. Tinha doiscompanheiros: o Cabrita, empregado naAdministração do bairro central, esguio [4]eamarello como uma tocha d'enterro; e o possante, o exuberante tenenteCouceiro, grande tocador de viola franceza.

A minha existencia era bem equilibrada e suave. Toda a semana, demangas de lustrina á carteira da minharepartição, ia lançando, n'uma formosaletra cursiva, sobre o papel Tojal do Estado, estas phrases faceis:«Ill.mo e Exc.moSnr.Tenhoa honra de communicar a V.Exc.ª... Tenho a honra de passar ás mãosde V.Exc.ª, Ill.mo e Exc.moSnr...»

Aos domingos repousava: installava-me então nocanapé da sala de jantar, de cachimbo nos dentes, e admiravaa D. Augusta, que, em dias de missa,costumava limpar com clara d'ovo a caspa do tenente Couceiro. Estahora, sobretudo no verão, era deliciosa: pelas [5]janellas meiocerradas penetrava o bafo da soalheira, algum repique distante dossinos da Conceição Nova, e o arrulhar das rolasnavaranda; a monotona susurração das moscasbalançava-se sobre a velha cambraia, antigovéo nupcial da Madame Marques, que cobria agora no aparadoros pratos de cerejas bicaes; pouco a pouco o tenente, envolvido n'umlençol comoum idolo no seu manto, ia adormecendo, sob africção molledas carinhosas mãos da D. Augusta; e ella, arrebitando odedo minimo branquinho e papudo, sulcava-lhe as rêpaslustrosas com o pentesinho dos bichos...Eu então, enternecido, dizia á deleitosa senhora:

―Ai D. Augusta, que anjo que é!

Ella ria; chamava-me enguiço! Eusorria, sem meescandalisar. Enguiço era com effeitoonome que me davam [6]na casa―poreu ser magro, entrar sempre as portas com o pé direito,tremer de ratos,ter á c
...

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